Amazonia Insomnia

Em 2018 participei como convidado na residência artística Labverde, na Floresta Amazônica brasileira, onde pude navegar na Amazônia. Após 3 dias trafegando de barco pelos rios, ficamos imersos durante uma semana na reserva Adolpho Ducke, no meio da floresta, próximo a Manaus. O local oferecia condições muito precárias de rede telefônica e internet. A conexão que acontecia ali era principalmente com a natureza em seus aspectos mais profundos. Para um artista que busca captar a essência das coisas através das imagens, me parecia quase impossível alcançar este objetivo, pois por mais belas que fossem as fotografias e representações da floresta, elas pareciam não conseguir traduzir a intensidade de estar ali. Isso me fez pensar no poder mítico que a natureza exerce sobre nós e nas maneiras que os povos originários se utilizam para acessá-lo.

Após alguns dias com a cabeça cheia de imagens e experiências, criei a videoinstalação Amazonia Insomnia para tentar evocar esse poder mítico. Durante a residência, vinha observando e filmando os reflexos da floresta na água dos rios que a atravessam. Através da edição de vídeo, decidi reunir esses reflexos e duplicar e espelhar as imagens, formando uma espécie de mandala caleidoscópica, que produz uma certa sensação hipnótica no observador.

Posteriormente, optei por projetar o vídeo no próprio quarto em que eu dormia no casebre da Reserva Adolpho Ducke. O local, bastante simples, tinha apenas uma cama de madeira, coberta com um mosquiteiro de tule verde, que conferia uma atmosfera mais onírica à projeção. Retirei o colchão, deixando apenas o estrado de madeira aparente, que foi coberto com folhas e galhos que encontrei na floresta. O trabalho buscava evocar os espíritos da floresta em uma atmosfera contemplativa de sonho e delírio visual.

Após a apresentação do trabalho enquanto videoinstalação realizada na reserva Adolpho Ducke, passei a expor também o vídeo Amazonia Insomnia isoladamente, pois acredito que ele funciona bem independentemente da instalação. A primeira versão do vídeo foi apresentada sem som, entretanto, posteriormente, pude editar a trilha sonora a partir de sons coletados na Amazônia, que foram distorcidos e intensificados para criar uma atmosfera ainda mais misteriosa.

A captação eletrônica de imagens e vídeos da floresta e sua posterior edição não representam, a meu ver, um distanciamento da natureza, mas sim uma possibilidade tentar acessar o invísivel, o incomensurável e o inapreensível. A linguagem digital do vídeo, devido a sua fluidez e maleabilidade, permite que se dê asas à imaginação e se chegue a mundos plenos de sensações. Os povos originários da Amazônia, através de seus rituais xamânicos que envolvem o consumo de ayahuasca e as artes das pinturas corporais, cerâmica e cestaria buscam atingir estes mundos espirituais que vão além dos corpos terrenos. Em meu trabalho Amazonia Insomnia busquei, através da tecnologia e da sensibilidade, me aproximar destes planos etéreos que se escondem para além dos reflexos dos rios, por trás das almas das árvores e na interioridade dos espíritos dos bichos.