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                   Pensar-se-ia
                  que após um século de overdose visual em que se buscou
                  intensamente o inteligível no ver e se combateu intensamente
                  o ver como forma de acesso ao inteligível, se  regressaria agora à longa e tranquila busca dos fundamentos,
                  do ser e não ser, por e através da Palavra – ( “ Pois bem eu te digo - cuida da palavra escutada - as duas únicas vias
                  que nos fazem ver...” fragmento
                  2 do Poema de Ser de Parménides ). Mas eis que
                  no excesso dos excessos as imagens sucedem às imagens. A sequela
                  “Guerra no Iraque – II “ trouxe-nos outras vez as ....
                  imagens. Na primeira guerra do Golfo as palavras escutadas
                  foram vedetas. È verdade que a memória que ficou de 1991 foi
                  uma proto-imagem. Foi  a
                  de um céu em Bagdade, nocturno,  esverdeado,
                  rasgado pelas luzes das antiaéreas. No entanto  foram
                  as palavras do relato de Peter Arnet, a partir da varanda do 
                  Hotel Al-Rasheed que se ouviram durante horas e dias a
                  fio. “ Uma
                  imagem vale mais que mil palavras” foi a frase enganou tanto
                  os apologistas como os críticos das imagens. Os apologistas não
                  perceberam o quão pesadas, lentas e incapaz eram as imagens
                  para penetrar em domínios da experiência que não as
                  preparavam As imagens electrónicas reinaram em cenários
                  orquestrados ( estúdios, estádios, palcos, praças )
                  preparados por pesadas máquinas e exércitos de homens que
                  nos fizeram esqueceram a sua falta de agilidade. Os críticos
                  não entenderam as paixões do visível obcecados por ditar
                  que tudo na lógica da experiência nos transporta ao inteligível.
                  Por isso não conseguiram responder à pergunta: - Por onde
                  nos conduzem as imagens?  
                  
                   Estas guerra
                  repetente com o Iraque trouxe-nos novas imagens. O seu poder não
                  está nem na ultra-definição. Não está no
                  “mais-que-belo” tecnológico das melhores cores, melhores
                  enquadramentos, melhor óptica. Não sei se
                  repararam mas as imagens estão ....ALADAS. Voam, 
                  estas imagens voam. Sim, as
                  imagens já voavam, nos aviões, nos estúdios, mas estavam
                  prisioneiras de fios e de montagens. Estas são imagens
                  desligadas – wireless. Acompanham o ritmo das palavras, do
                  pensamento, enquanto acompanham o 7º de Cavalaria no deserto
                  iraquiano. Às 4.30 do
                  dia 21 de março, milhões de pessoas viajavam pelo deserto do
                  Iraque ao ritmo dos tanques, sem montagens, de olhos
                  desfocados, com um horizonte a desfazer-se em quadrados. O nosso
                  estatuto, sentados nos sofás é o de prisioneiros de guerra.
                  Estamos prisioneiros deste visível, desta paixão que não
                  controlamos, a “ curiositas” pelo brinquedo tecnológico.
                  Sim, nada nos impede de tomar uma posição a favor ou contra
                  a guerra, de a discutir de participar em manifestações. No
                  entanto a questão fundamental 
                  é a do  experiência
                  da guerra e essa activa-se e resolve-se no sofá, no tempo e
                  no quadro das imagens. Aí não domina a repulsa, o medo, o
                  penico mas sim o “gadjet” electrónico. “Mas como é que
                  eles fizeram isto?” , “ Como é que nos enviam imagens dos
                  tanques em pleno deserto, sem carros de exteriores?” , “
                  Onde é que o repórter tem a câmara?”. As tácticas
                  militares dizem-nos que a guerra só tem a perder
                  mostrando-se. Será? A guerra pode-se vencer mostrando-se? A surpresa
                  desta guerra é que a estamos a ver. Incrédulos vimos
                  jornalistas, já não em mangas de camisas, mas com coletes à
                  prova de balas, rostos pintados – guerreiros repórteres. A verdadeira
                  guerra trava-se  pela nossa experiência. Qual das tentações ou sensações
                  associadas ao visível é mais forte? O exército
                  norte-americano ataca com o maravilhoso tecnológico das
                  imagens aladas, de mísseis de precisão, procura ocupar a
                  experiência do sujeito do videojogo. O iraquianos
                  dirigem à velha experiência carnal, à exposição do
                  sangue, dos prisioneiros espancados e “arrependidos”.
                  
                   Trata-se, na
                  minha opinião de um conflito pela experiência que vai mais
                  além que o simples conquistar de adeptos a favor ou contra a
                  guerra. Trata-se de lutar pelas convicções. A quase
                  totalidade dos SIM e dos NÃO estão dentro de um jogo que no
                  limite não perturba a guerra e só a favorece. OS adeptos do
                  SIM e do NÃO adoram o jogo.  Escolhe um dos lados, que secretamente deseja ver vencer. Não
                  é a experiência da guerra que verdadeiramente lhe traçou a
                  opinião, mas os jogos em que está envolvido emocionalmente:
                  -  o jogo partidário,
                  o jogo do americanismo ou do anti-americanismo, o jogo dos
                  ricos contra os pobres, o jogo da “massificação cultural
                  ocidental “ contra o “exotismo oriental”. Estão todos
                  dentro a experiência das imagens e da febre instantânea que
                  ela provoca. Dentro de dias voltarão às ruas pela pedofilia
                  ou pelos nitrofuranos. Passada a
                  guerra esquece-se rapidamente. As imagens aladas são como as
                  palavras de Sócrates, belas e fugidias ... leva-as o vento. A verdadeira
                  experiência da guerra é longa, dolorosa e infindável. A
                  imagem que a mostra,  o 
                  relato que a conta, andam por aí perdidos no meio das
                  imagens e da vozes. Alguém os ( as) consegue não ver? |