trans.gif (43 bytes) trans.gif (43 bytes)

  Francis Bacon: Notas Sobre a Exposição CAGED - UNCAGED

  [ Margarida Carvalho ]

trans.gif (43 bytes)
trans.gif (43 bytes)

 

 

 

«I think that the very great artists were not trying to express themselves. They were trying to trap the fact, because, after all, artists are obsessed by life and by certain things that obsess them that they want to record. And they’ve tried to find systems and construct cages in which these things can be caught.» Francis Bacon[1]

Caged – Uncaged, a exposição da obra de Francis Bacon, apresentada no Museu de Serralves, entre 25 de Janeiro e 20 de Abril de 2003, é sem dúvida alguma um dos grandes acontecimentos artísticos do presente ano e marca o primeiro encontro do público português com uma exposição inteiramente dedicada a um dos pintores mais inovadores e fundamentais no panorama europeu da arte do século XX. A mostra, organizada exclusivamente para o Museu de Serralves, apresenta cerca de 50 obras, reunindo alguns dos seus trabalhos mais divulgados, assim como outros raramente exibidos, não pretendendo fazer uma retrospectiva da obra de Francis Bacon, mas sim incidir sobre uma das linhas centrais do seu trabalho, definida por Vicente Todolí, comissário da exposição, enquanto «uma reflexão sobre a condição humana e uma incursão na natureza da própria pintura e da arte criativa, dividida entre a estrutura da razão, a composição e o uso do acidental e do instintivo, para criar uma pintura que anseia por existir»[2].

O par de conceitos trabalhados incide portanto numa temática da clausura, quer a um nível existencialista, o indivíduo encerrado numa atmosfera claustrofóbica, quer a um nível formal, evidenciando a relevância das estruturas espaciais internas enquanto dispositivos que permitem concentrar a atenção na figura, e da libertação, quer pela violência dos afectos e pelas contorções dos gestos e movimentos das figuras, quer pela presença das paisagens, na sua expansão cromática e densidade da pintura, no período de 1956-1957, e na sua depuração e simplicidade crescentes, elidindo a figura humana, nos anos 80. De salientar, no entanto, que em plena sintonia com os conceitos trabalhados justificava-se uma maior presença dos trípticos, sem dúvida, o formato mais potente na obra de Bacon, onde a dialéctica do enclausuramento e a vertigem da justaposição atingem o ápice possibilitando uma afectação estética de uma violência e emoção invulgares - e a sala do museu dedicada aos trípticos está aí para o evidenciar. Simultaneamente, a presença das paisagens, opção aparentemente importante em termos do desenho conceptual da exposição, tende a diluir-se, muito contribuindo para isso o pequeno (enclausurado) espaço que lhes é atribuído, que mais se assemelha a um espaço de passagem (entre duas salas que são substancialmente maiores) e que não atribui aos quadros a respiração, a soltura que lhes é devida.

Mas claro, Bacon é um daqueles pintores cuja obra nós vamos visitar sôfregos de expectativa, lutamos contra os reflexos no vidro[3], contra a imagem do nosso espanto e da nossa sofreguidão face a tanto talento, a tanta marca amorosa e ébria, à fabulosa combinação do génio e do acidente na textura marcada pelo pincel. Toda a sua vida, Francis Bacon afirmou que as suas obras não significavam nada, que ele não pretendia veicular nenhum sentido. Uma obra discursiva era sinónimo para ele de banalidade[4], sendo que o artista ambicionava o entrelace da imagem e da pintura, num jogo de risco, onde a composição se impregnava do acidente da pincelada e do pigmento. Saber parar podia salvar a graça de uma figura; avançar, trazer o golpe do real na espessura do pigmento inesperado. Jogo da razão e do acaso, mas sempre do risco e do contraditório, tal foi a marca de Francis Bacon na vida e na pintura.

É conhecida a admiração que Bacon acalentava por Picasso, nomeadamente pelo facto deste enraizar o realismo no inconsciente, oferecendo, nas palavras de Bacon, a «brutalidade do facto». «When I talked about the brutality of fact in Picasso, I meant that Picasso in a curious way was able to put it across more directly and with less expressionism in it. It seemed to be the fact itself without the will to express»[5]. O facto-em-si-mesmo, enjaulado (trapped, caught), na redoma de vidro, espelhado, enquadrado, fragmentado,  homem-animal, movimento-grito de seda, silenciado, negritude que faz passar a vida na pintura.

Study for Portrait, 1949. É isso que mais me fascina: a coincidência perfeita entre a imagem, a angústia, a limitação existencial, a agressividade, e a pintura, a mancha negra da boca[6], voraz, e o “meu”[7] reflexo azul, fragmento de movimento e passagem que liga o dentro da “jaula” de vidro (Bacon diria que não se trata de uma “jaula” de vidro) ao fora representado no quadro e ao exterior onde me encontro na galeria.

Ainda do mesmo ano, 1949, o delicadíssimo e comovente Study from the Human Body; luminoso, evanescente, fantasmático, o primeiro nu de Francis Bacon (do período dominado por grisailles) representa a figura de um homem de costa e nádegas voltadas para nós, que atravessa delicadamente uma cortina pintada a pinceladas aguadas de branco e cinzento sobre uma tela sem preparação. A delicadeza da cor e do movimento daquele homem, a perna direita semi-encoberta pela cortina, as costas translúcidas que desenham o traço da espinha que termina no quebranto da nuca, perfeita e desejável, transformam este nu num dos mais belos da obra de Francis Bacon, podendo ter sido o primeiro inspirado na obra fotográfica de Muybridge e revelando já a influência da imagética das radiografias[8] no trabalho do pintor.

1950, marca o surgimento das primeiras versões da imagem (a corpo inteiro) do Papa, realizadas a partir de Portrait of Pope Innocent X[9], 1650-1, de Diego Rodríguez de Silva y Velázquez. Study after Velázquez, 1950, fazia parte de um conjunto de três quadros que Bacon tinha planeado pintar para a sua exposição na Hanover Gallery, em Setembro desse ano. Tendo completado apenas dois dos quadros planeados, o artista decidiu  no último momento retirá-los da exposição na medida em que considerava que eles deveriam ser apresentados em série. Em Novembro, parte para a sua primeira viagem a África, sendo que no regresso, já em 1951, Bacon teria mandado destruir as duas telas, decisão da qual mais tarde se veio a arrepender, tal como confessou a David Sylvester. No entanto, Study after Velázquez ressurgiu após a sua morte, tendo sido preservado da destruição por terceiros, e apresenta-se hoje como um dos mais relevantes Papas pintados por Francis Bacon. Nele, o pontífice é apresentado num espaço absidal, a face crispada num uivo (invocando o rosto ensanguentado da ama, na famosa sequência dos degraus de Odessa, do filme O Couraçado Potemkim de Eisenstein) sob a sufocante cortina cinzenta que alastra no chão escarlate. A caixa branca de composição e o corrimão, que acentua a profundidade do espaço, fragmentando o corpo do pontífice e afastando-nos para trás, contribuem para capturar a figura, embora a segunda cortina que se solta do corrimão para vir abrir, de forma fantasmática, a vermelhidão do chão crie uma impressão de movimento, como se uma corrente de ar perpassasse as camadas veladas dos cortinados esbatendo a clausura do espaço. Com efeito, as dobras das cortinas pintadas em Study after Velázquez dão-nos conta de um dispositivo central na obra de Bacon, por ele designado de shuttering, inspirado numa fase tardia da pintura de Degas, e que consiste na utilização de uma série de linhas paralelas que atravessam verticalmente a figura, dando-lhe transparência e, simultaneamente, acentuando de modo formal a carga dramática da imagem, uma certa diluição violenta da figura atravessada pela implacabilidade das barras e traços verticais.

Após 1952, a pintura de Francis Bacon tornou-se mais transparente e os azuis invadiram a sua paleta monocromática. É o chamado período azul, consagrado na famosa série Man in Blue, da qual podemos ver em Serralves três das sete versões pintadas por Francis Bacon. Study for a Portrait (Man Screaming), 1952, e Study of a Baboon, 1953, são dois quadros paradigmáticos do devir-animal, da criação de uma hibridação, de uma zona de indiscernibilidade entre o homem e o animal, patente na obra de Bacon e expressa na sua famosa frase, que serve de mote à exposição Caged – Uncaged,  «deixar o elemento animal libertar-se do humano». Em Study for a Portrait (Man Screaming), o movimento do corpo humano projecta o grito de um modo particularmente animalesco, numa agressividade acentuada pelo dispositivo formal de shuttering, que estica e distorce o rosto deste homem de fato sentado em “trono” adornado a dourado. Em Study of a Baboon, é a contorção gritada do macaco na sua jaula que nos atinge, o seu corpo azul transparente sobre o dourado expansivo da vegetação, impregnada de movimento, dir-se-ia também ela ostentando a potência selvagem da vida. Ondulação verde e dourada, densa e sôfrega, que retorna no fabuloso Two Figures in the Grass, 1954, em que o enlace amoroso de dois homens, funde relva e pele na violenta voracidade da paixão sexual. Nesta belíssima pintura, Francis Bacon introduz a paisagem num dispositivo arquitectónico - as paredes ao fundo onduladas pelas dobras das cortinas -  o qual será retomado numa fase tardia do seu trabalho, durante a qual as paisagens sofrerão uma progressiva depuração e simplificação em termos de composição, desaparecendo a figura do humano e acentuando-se uma evidente tensão entre a natureza e o geométrico, sendo Sand Dune, 1983, exemplar neste sentido.

Em 1956 evidencia-se, na obra de Francis Bacon, uma progressiva insatisfação em relação à pintura tonal e ao jogo da figura e do fundo, que acentuava a profundidade no tratamento da imagem, tendência consagrada quando, no início dos anos 50, Bacon deixa de trabalhar telas sem preparação, optando ao invés por passar a aplicar uma fina camada de uma mistura de óleo e turpentina em tons de negro ou azul escuro. As suas estadias em Tanger, onde mantinha uma intensa e turbulenta relação com Peter Lacy[10], devem igualmente ter afectado a paleta do pintor sendo que, entre 1956-57, vemos surgir uma fase de transição na obra de Bacon, onde a cor explode numa densidade inédita, evidenciando um trabalho de pincel e uma intensidade na aplicação das camadas cromáticas visivelmente influenciadas  pelo trabalho do pintor expressionista Chaïm Soutine, nomeadamente pelas obras do período Céret. Assim, em 1956, Francis Bacon inicia uma série de quadros que têm como ponto de partida o auto-retrato de Van Gogh Sur la Route de Tarascon, 1888, prestando homenagem ao pintor holandês cujos três volumes de cartas Bacon relia e citava apaixonadamente, a fim de comprovar a cultura e os interesses de Van Gogh, contrariando a imagem mítica deste pintor enquanto um homem rural, neurótico e algo inculto, apesar de extremamente talentoso. Van Gogh in a Landscape, 1957, é uma das obras mais inesperadas da série Van Gogh, tal como Martin Harrison faz notar, em Bacon: Caged – Uncaged[11]. Com efeito, a particularidade do ponto de vista faz com que o quadro abarque uma parte invulgarmente extensa da vegetação em primeiro plano, relegando a figura para uma presença mínima mas cintilante, nesse ponto amarelo que inscreve a fragilidade do movimento humano no dinamismo vitalista e denso da selvática paisagem.

Este período, abertamente influenciado por Van Gogh e Chaïm Soutine, evidencia a fase de transição na obra de Bacon, marcando o seu afastamento definitivo em relação à pintura tonal e a uma linguagem influenciada por Goya e Manet, e abrindo caminho para uma nova direcção exploratória, que se irá consolidar de modo evidente a partir de 1965, com o tratamento da imagem enquanto superfície e a opção pelo uso de acrílicos, maioritariamente em cores claras, para os fundos dos quadros, da qual Three Portraits: Posthumous Portrait of George Dyer, Self-portrait, Portrait of Lucian Freud, 1973, nos oferece um belo testemunho. No mesmo ano, Francis Bacon pinta o impressionante e dramático Triptych May-June 1973, num acto de exorcismo e compaixão pelo seu amante George Dyer[12], que se suicida em vésperas da inauguração da retrospectiva da obra do pintor, apresentada em Outubro de 1971, no Grand Palais de Paris. Obra de extraordinário impacto, na sua grandiosidade das trevas e do mergulho na morte, poderíamos afirmar, com David Sylvester, que a negridão é o seu tema de tal maneira ela assombra, devora e projecta, esse corpo contorcido pelos espasmos da carne e da alma. O formato do tríptico respira aqui toda a sua imponência: os três painéis apresentam sucessivamente uma figura sobre um rectângulo negro central, debruado por uma faixa branca e seguido de uma nova barra rectangular em vermelho púrpura, a cor da parede do quarto fatídico representado. David Sylvester sugere a influência de Matisse nesta composição dividida por linhas verticais. Nas suas palavras: «It may well be that here again Matisse’s Bathers by a River was a model, since its composition is firmly divided by vertical lines that create a series of wide bands, the most assertive of which are black or off-white, and each of which has a figure in front of it. Just as Matisse used his vertical lines to separate his figures one from another, Bacon separates the figures one from another by giving each panel a single figure»[13]. No painel esquerdo, o corpo robusto de George Dyer, sentado, dobra-se sobre si mesmo numa vulnerabilidade sofrida que acresce em violência no painel direito em que a contorção abre a boca da figura num vómito. O painel central é surpreendente, o corpo quebrantado de Dyer, curvado sobre o negro e iluminado pela luz crua da lâmpada, é duplicado pelo abraço da morte de uma sombra biomórfica que, fundindo-se no corpo dele, projecta-se na soleira da porta, assemelhando-se à silhueta de um morcego, mas devendo ser provavelmente uma Fúria, a deusa grega do cabelo-serpente  que atormenta os condenados no Inferno e à qual Bacon várias vezes alude na sua obra.

Na parede oposta à de Triptych May-June 1973, o rosto de Francis Bacon no painel lateral direito de Triptych, 1991, olha de frente o dilaceramento brutal do seu amante, auto-retrato de um rosto macerado pelas intensidades de uma vida singular. Neste magnífico trabalho, realizado no ano anterior à sua morte, evidencia-se a qualidade teatral da imagem realizada com extremo rigor formal, numa crescente depuração e mesmo estilização ao nível da composição. Triptych, 1991, com os seus retratos “fotográficos” nos painéis laterais (o de Peter Beard, amigo fotógrafo no painel da esquerda, e o auto-retrato de Bacon, no da direita), a citação dos lutadores de Muybridge no painel central, e a obsessão com o trabalho da figura num jogo entre o corpo humano e o elemento geométrico, testemunha a profunda vitalidade criativa de Francis Bacon, evidenciando num último fôlego a extraordinária combinação entre um depurado formalismo e a famosa «brutalidade do facto» que não cessou de retornar na sua pintura, uma das mais singulares e intensas da experiência artística europeia contemporânea.

                                                                                                              Margarida Carvalho

                                                                                                                             Março de 2003



[1] Bacon, Francis, «Aesthetics», in Sylvester, David, Looking back at Francis Bacon, London, Thames & Hudson, 2000, p. 248.

[2] Todolí, Vicente, «Francis Bacon: Caged – Uncaged», texto de apresentação da exposição. Citado a partir do material de divulgação fornecido pela Fundação de Serralves, uma vez que o catálogo da exposição ainda não estava disponível para venda ao público durante o mês de Março.

[3] Tal como David Sylvester faz notar: «Ambiguity and obscurity are also introduced by the reflections in the glass that Bacon insisted on interposing between picture and spectator. (…) Inevitably, glass tends to reflect the spectator and the room, and I once asked Bacon whether the reflections were something he positively wanted. “I don’t want them to be there; I feel that they should be put up with. I feel that, because I use no varnishes or anything of that kind, and because of the very flat way I paint, the glass helps to unify the picture. I also like the distance between what has been done and the onlooker that the glass creates; I like, as it were, the removal of the object as far as possible”» (Sylvester, David e Bacon, Francis, «A late starter», in Sylvester, David, op. cit., p.22).

[4] Citando Francis Bacon: «I’m just trying to make images as accurately off my nervous system as I can. I don’t even know what half of them mean. I’m not saying anything. Whether one’s saying anything for other people, I don’t know. But I’m not really saying anything, because I’m probably much more concerned with the aesthetic qualities of a work than, perhaps, Munch was. But I’ve no idea what any artist is trying to say, except the most banal artists» (Bacon, Francis, «The painter as medium», in Sylvester, David, op. cit., p. 186).

[5] Bacon, Francis, «Modern Art», in Sylvester, David, op. cit., p. 242.

[6] «You could say that a scream is a horrific image; in fact, I wanted to paint the scream more than the horror. I think if I had really thought about what causes somebody to scream it would have made the scream that I tried to paint more successful. (…) In fact they were too abstract (…) I’ve always been very moved by the movements of the mouth and the shape of the mouth and the teeth. People say that these have all sorts of sexual implications (…) I like, you may say, the glitter and colour that comes from the mouth, and I’ve always hoped in a sense to be able to paint the mouth like Monet painted a sunset» (Bacon, Francis, «A late starter», in Sylvester, David, op. cit., p. 29-30).

[7] David Sylvester sublinha que «these paintings seem to have been lying in wait for that enhancement, one that comes about through the arrival on scene of spectators whose presence brings mysterious shadows into the picture, a presence that Bacon acknowledges by implication in the cast shadows of invisible spectators in the foregrounds of Study for Portrait, 1949, and Portrait of Lucian Freud, 1951. At the same time, we do feel tempted to find a vantage point from which reflections are minimal or absent, and we do tend to settle in such a position. This is rarely a position face to face with the picture – least of all with the works that have a black area in the centre – and all of this tends to pose the question as to whether the reflections weren’t a strategy of Bacon’s to encourage his paintings to be viewed obliquely rather than head on» (Sylvester, David, op. cit., p. 24-25).

[8] Tal como David Sylvester faz notar: «The figure [in Study from the Human Body, 1949] is the first of many which show an undying love for the Degas pastel in the National Gallery, London, of a woman drying herself: [Francis Bacon referring to Degas’ After the Bath, Woman Drying herself, 1890-5] “You will find at the very top of the spine that the spine almost comes out of the skin altogether. And this gives it such a grip and a twist that you’re more conscious of the vulnerability of the rest of the body than if he had drawn the spine naturally up to the neck. He breaks it so that this thing seems to protrude from the flesh (…) in my case, these things have certainly been influenced by X-ray photographs”» (Sylvester, David e Bacon, Francis, «A state of unease», in Sylvester, David, op. cit., p. 54).

[9] David Sylvester sublinha que: «Bacon had a tremendous drive to make variation after variation on this image. Velázquez was his preferred painter, and this particular portrait could have been expected to have an especial appeal to him in that the paint is freer and looser and the whites more flickering than in any other Velázquez, almost as in a Gainsborough. But until 1990 Bacon never in fact saw the work in the original, not even when he spent several weeks in Rome in 1954. He knew it in reproduction, and reproductions convey no hint of its freedom of handling. Was Bacon, then, drawn to this particular Velázquez by its subject? The Pope is il Papa, and Bacon had very strong feelings about his father. “I disliked him, but I was sexually attracted to him when I was young. When I first sensed it, I hardly knew it was sexual. It was only later, through the grooms and the people in the stables I had affairs with, that I realized that it was a sexual thing towards my father”. Painting popes in their isolation could well have been, among other things, a way of bringing back is father, of spying on him, of demolishing him. Bacon always resisted any psychoanalytic interpretation of his passion for the picture. On one occasion he let down his defences enough to tell that his obsession with it was “like schoolboys having a crush on their housemaster or something”, then immediately corrected any hint that he was drawn to something paternal in the image by affirming the work’s aesthetics qualities: “I’ve always thought that this was one of the greatest paintings in the world and I’ve had a crush on it”» (Sylvester, David e Bacon, Francis, «A trail of the human presence», in Sylvester, David, op. cit., p. 41-42).

[10] Na minuciosa biografia de Francis Bacon apresentada em Looking back at Francis Bacon, David Sylvester escreve: «Bacon’s foreign travel during the 1950s was, by chance, mainly to Africa. Sometimes he would go to stay with his mother and his sisters Ianthe and Winifred, who lived in southern Africa. At others he would spend lengthy periods in Tangier so as to keep up with the movements of someone with whom he was having a long, punishing, tormented liaison. Peter Lacy was a former fighter pilot and test pilot with private means who played the piano in bars, and who was the subject of most of the pictures of men wearing suits widely perceived as businessmen and who was manifestly one of the two men in Two Figures, 1953, the first of Bacon’s images of coupling» (David Sylvester, «Biographical Note», in op. cit., p. 259).

[11] Harrison, Martin, Bacon: Caged – Uncaged, texto crítico de apoio à exposição. Citado a partir do material de divulgação fornecido pela Fundação de Serralves.

[12] A conturbada relação com George Dyer inicia-se em 1963, sendo que David Sylvester o descreve enquanto «a rugged young man with a criminal record but the gentlest of temperaments who inspired most of Bacon’s finest paintings of the nude, culminating in a remarkable series of triptychs mourning his death. Dyer’s lack of a role in life heightened a drink problem, and his relationship with Bacon became increasingly fraught. Heavily dosed with alcohol and drugs, he died on 24 October 1971 in a Paris hotel room two nights before the opening of a retrospective at the Grand Palais which for Bacon was surely the most significant exhibition he ever had» (Sylvester, David, op. cit., p. 263). Referindo-se a George Dyer, em entrevista com Michael Peppiat, Bacon afirmava que «his stealing at least gave him a raison d’être, even though he wasn’t very successful at it and was always in and out of prison. But it gave him something to think about. When George was inside, he’d spend all his time planning what he would do when he came out. And so on. I thought I was helping him when I took him out of that life. I knew the next time he was caught he’d get a heavy sentence. And I thought, well, life’s too short to spend half of it in prison. But I was wrong, of course. He’d have been in and out of prison, but at least he’d have been alive. He became totally impossible with drink. The rest of the time, when he was sober, he could be terribly engaging and gentle. He used to love being with children and animals. I think he was a nicer person than me. He was more compassionate. He was much too nice to be a crook. That was the trouble. He only went in for stealing because he had been born into it» (Francis Bacon, «An escape from emotion», in Sylvester, David, op. cit., p. 135).

[13] Sylvester, David, op. cit., p. 144.