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  DIVX - UM CASO NA CLONAGEM DIGITAL

  [ Jacinto Godinho ]

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The release of the summer's first blockbuster movies has sparked an unprecedented frenzy of film piracy, sending nearly 10 million people online to download bootleg copies of "Spider-Man" or "Star Wars: Episode II - Attack of the Clones.

Um dos maiores roubos da história terá sido praticado entre Maio, Junho e Julho. Nesses meses pelo menos 3,5 milhões de pessoas adquiriram de forma ilícita uma cópia do filme “Spider-man”. A investigação é de uma empresa norte-americana, sediada em Boston e especializada em entretenimento digital – a Viant.

Não se trata aliás de um caso único. Os responsáveis por este roubo colectivo actuam em todos os países do mundo e dedicam-se a actividades ilícitas todos os dias e a toda a hora. Neste momento cerca de um milhão de filmes circula ilegalmente pela Terra, criando prejuízos incalculáveis e pondo em risco não só um dos mais sólidos negócios que o século XX produziu – o negócio dos filmes – como a sua principal fábrica situada em Hollywood, Los Angeles.

O principal responsável por este inédito assalto colectivo é um minúsculo e aparentemente insignificante conjunto de instruções informáticas – o Divx. O Divx é código baseado num algoritmo que permite comprimir e descomprimir sinal vídeo digital. Esperando não deturpar o rigor técnico da explicação ouso tentar a metáfora para explicar de uma forma mais simples como me funciona o divx. Tal como o ADN é um conjunto de instruções miniaturizadas para reconstruir um humano, o divx permite que um filme possa ser miniaturizado num PC.

Assim se por exemplo um filme ocupar cerca de 6 gigabits de informação num DVD, o divx permite comprimi-lo para uma cópia que ocupa dez vezes menos espaço no disco rígido podendo então ser facilmente gravado num Cd de 0,50 euros. O clone digital assim produzido, fica armazenado num corpo de bits, dez vezes mais pequeno, ocupando menos espaço, possibilitando a cópia infinita. Finalmente, é também capaz de viajar sem bloqueios pelas actuais redes digitais de banda larga replicando-se em apenas algumas horas para qualquer parte do mundo.
À luz da racionalidade clássica seria com um embrião de leitura, semeado de imagens criminais - “roubo”, “assalto”, “prejuízos” – que se espalharia no espaço público a anuncio do fenómeno Divx. Embrulhado já portanto numa capa de ilegalidade, apelando a uma codificação legislativa apertada e preparando uma criminalização impiedosa.
Foi assim que no passado se combateram outras possibilidades clónicas da era analógica. Entre elas a “moeda falsa” foi, sem duvida a mais famosa e a mais tentadora. O que se falsifica não é a “moeda” mas sim as notas de papel, que como todos os produtos cujo valor depende mais da “aura” simbólica que do valor do suporte ( ao contrário do metal o papel da nota não cobre o valor que ostenta ), foram sujeitos, nos tempos modernos, a uma enorme pressão da cópia e do tráfico.

Sobre as roupas, electrodomésticos, perfumes, e outros objectos sobrevalorizados pelo valor simbólico da marca sempre pesou o fantasma da cópia.
No entanto o Divx, e a clonagem digital de filmes que possibilita, funcionam num território – o ciberespaço – tão complexo que apesar do seu nome indicar um espaço de controlo total, cada vez mais se verifica que o conjunto das práticas que nele se vai instalando minam por dentro a racionalidade dialéctica que o tenta depurar e efectivamente controlar.

É tempo portanto de reavaliar as condições sociais, éticas e políticas que o ciberespaço vai gerando e aproveito o “caso Divx” para semear algumas, breves, reflexões.

O Divx é um típico produto de hacker. Trata-se de um codigo roubado à Microsoft. Esta empresa procurava encontrar uma solução matemática para a terceira geração de compressão vídeo. Primeiro surgiu o mpeg-1 construído pelo Moving Picture Experts Group, um comité internacional de especialistas trabalhando em vários pontos do mundo, que através de formatos como o VCD o vídeo digital ao nível do vídeo analógico, permitindo que ao PC gerar imagens com a qualidade sofrível do VHS. Depois surgiu o Mpeg-2 que colocou definitivamente o sinal de vídeo digital muitos furos acima do sinal analógico utilizado pelos televisores e pelos leitores de vídeo VHS. O Mpeg-2 cujo formato mais conhecido é o DVD consegue capturar com uma qualidade assinalável a textura e a definição que até então só a película cinematográfico conseguia apresentar. No entanto o seu excessivo peso em Gigabits tornam-no ainda um formato incompatível com a circulação na na Internet. Em finais do anos 90 a Microsoft procurava desenvolver o Mpeg-4 a nova geração da miniaturização digital ( “4” porque um código de compressão áudio tinha-se entretanto popularizado como Mpeg-3, mais conhecido por Mp3).

O novo formato permitiria à Microsoft dominar o mercado de transmissão em “streaming” na WWW, comercializando o código de transmissão de imagens vídeo com bastante qualidade.
Os contornos do roubo não são conhecidos , mas o que é certo é que o codec inacabado da Microsoft aparece em 1999 nas mãos de dois jovens engenheiros franceses que em pouco tempo conseguem realizar o que dezenas de engenheiros da multinacional norte-americana não conseguiram – um código capaz de comprimir imagens de vídeo digital sem grande perca de qualidade.

Le Mpeg-2 , qui est à l`origine du DivX;-), est un standard officiel de compression vidéo défini par le groupement Motion Picture Expert Group. Or, il y a un peu plus d`un an, Jérôme Rota, un Français de 27 ans connu sous le pseudonyme de Gej, et un hacker allemand répondant au surnom de Max Morice, ont décidé d`améliorer les codec’s Mpeg-2 de micro$oft se basant sur une architecture Mpeg-4.
Aujourd`hui, Gej a fondé une association, baptisée Project Mayo, qui travaille à l`amélioration et à la diffusion du DivX;-) http://www.1formatik.com/compvideo.html

Preparava-se o assalto ao tesouro mais desejado – os filmes em DVD, cujo negócio de comercialização a nível mundial só avançou depois das grandes distribuidoras de filmes acharem que tinham nas mãos um sistema de encriptação perfeitamente fiável – o CSS (Content Scrambling Sistem) .
Também por volta de 1999, um jovem norueguês de 17 anos , Jon Johanssen quebrou o código de encriptação dos DVD´s – o CSS. A chave encriptada que levou anos a ser apurada e negociada foi assim quebrada por um miúdo que queria ver DVD´s no sistema Linux instalado no seu pc. Ao criar o deCSS ( decode CSS) Jon lançou o pânico em Hollywood e enfrenta agora um mega processo em tribunal, accionado pela MPAA - a poderosa Moving Picture Association – criada pelas grandes distribuidoras americanas para combater a pirataria de direitos de autor.

O que é curioso nesta história é a dificuldade em estigmatizar o Hacker. O hacker tem resistido a todas as tentativas para o tornar um criminoso tradicional. Ao contrário do falsificador de moeda, ainda não foi possível colocar o pirata informático no “lado obscuro” da lei onde pesa sobre os prevaricadores o peso negativo das palavras “ladrão”, “criminoso” etc.
Resiste na fronteira da provocação como um sedutor com poder de atracção. É por isso um curioso herói gótico cuja proezas são quase sempre recebidas com um sorriso nos lábios. Exactamente o oposto da imagem que nos meios informáticos tem o Bill Gates, cuja imagem de mago das novas tecnologias com aspecto adolescente não impediu que há sua volta se criasse a imagem negativa de perigoso controlador e manipulador.

Poucas elaborações teóricas tiveram tanto acolhimento popular quanto a denuncia do “sistema”. As massas acolheram com fervoroso empenho a ideia de que somos comandados por fios ou redes invisíveis que nos querem controlar. As vitimas do “sistema” criaram um sistema particular de “heróis” - os heróis anti-sistema - geralmente ídolos do rock com uma verborreia intensa impregnada de chavões de denuncia extraídos do laboratórios de psicanálise e de sociologia.

Desde os anos 80, que circulam “estórias” fabulosas de miúdos adolescentes capazes de descobrir os segredos da poderosa “Nasa” ou do poderoso “Pentágono”. Isto porque o ciberespaço, sempre entendido como espaço alternativo ao absolutismo real do espaço carnal, desenvolveu-se basicamente a partir da fruição da ilegalidade. Ele é efectivamente uma espécie de outro lado do espelho onde tudo funciona ao contrário. Onde o ilegal é a rotina e as leis oficiais, os códigos as regras são os “vilões” a abater. Desde o acesso gratuito à musica, aos filmes aos livros, á pornografia à violência nos videojogos, o ciberespaço parece poder realizar os piores vícios retirando-lhes alguns dos seus efeitos mais perniciosos.

O Hacker é o sujeito desta comunidade. Inteligente, astuto, capaz de superar todas seguranças, permanentemente defensor de uma ética anti-sistema. Mas apesar da ilegalidade ser um dos poderosos motores do ciberespaço é complicado entender o jogo das forças em presença como um jogo de forças conflitivas e antagónicas. A comunidade hacker é actualmente o melhor laboratório produtor de programas informáticos. Programas que recebem diariamente centenas de alterações, transformações e melhorias antes de serem protegidos em direitos de cópia por novas empresas. Analisar a ilegalidade da clonagem de filmes através do Divx é uma tarefa complicada porque em “open source” e alimentado pelas paixões do ilícito o código desenvolveu-se com uma rapidez alucinante contribuindo também para a rápida expansão das redes de banda larga.
À sombra da clonagem digital proliferam alegremente os negócios do ciberespaço. Christian Metz defendia que os filmes não alimentavam fetichismos porque não se possuíam. A cópia em quantidades quase bíblica de filmes que diariamente ocorre nos portais de troca de ficheiros como o ex-Napster ou o actual Kazaa e as imensas videotecas pessoais a que dão origem poderiam representar o colapso do sistema. No entanto e contrariamente à ordem tradicional das coisas a incontrolável clonagem de filmes não só não sufocou a experiência filmica como parece tê-la ampliado exactamente pela libertação da obsessão fetichista que trouxe.

2001 foi um dos melhores anos de sempre em termos de receitas de bilheteiras. Vários produtores europeus de cinema como o português Paulo Branco, apostam também nos efeitos perversos da clonagem digital esperando que ela quebre o monopólio da distribuição que prejudica os filmes europeus.

No entanto o fenómeno mais inovador relacionado com o Divx talvez seja o facto de possibilitar o artesanato da clonagem digital. Os programas que desencriptam e comprimem os filmes podem ser utilizados por qualquer possuidor de PC tornando-se assim numa espécie de arte caseira. Esta vontade de manufacturar o imaterial é um dos mais curiosos contra-sensos da experiência moderna.